É estranho que alguns economistas defendam que, para controlar a inflação, o desemprego deva ser maior
Steinbruch é diretor-presidente da CSN e primeiro-vice-presidente da Fiesp
Jim O’Neill, o economista britânico sempre festejado por ter sido o criador, em 2001, do acrônimo Bric, esteve no Brasil há duas semanas e deu uma bronca em alguns colegas brasileiros. “Em nenhum outro lugar eu ouviria economistas reclamando de que o desemprego está baixo demais. Esse é o tipo de problema que qualquer ministro de Finanças europeu reza para ter”, afirmou.
O’Neill, que participou de um congresso sobre mercados financeiros em Campos do Jordão, merece aplausos. O Brasil deveria agradecer muito por ter atravessado os cinco anos de crise global sem aumento de desemprego. Nada é mais dramático para uma sociedade do que a falta de postos de trabalho, que traz desesperança aos chefes de família e desestrutura a sociedade.
É o que se vê hoje em alguns países europeus. Espanha e Grécia, por exemplo, têm índices de desemprego que atingem 26% a 27% da população economicamente ativa. Mais de 50% dos jovens desses países estão sem trabalho e não têm como iniciar sua vida profissional.
Portugal também tem índice alto, de 16,5%. Felizmente, alguns países europeus, como a Alemanha e a Noruega, ainda mantêm uma taxa de desemprego inferior a 6%.
É sem dúvida estranho que alguns economistas brasileiros venham defendendo a ideia de que, para controlar a inflação, o País deveria conviver com uma taxa de desemprego mais alta do que os atuais 5,6%, além de elevar a taxa de juros.
Uma das constatações mais significativas das megamanifestações de junho foi a inexistência total de cartazes com referência a emprego ou desemprego, em gritante contraste com o que se vê nas ruas de grandes cidades europeias, onde essas questões estão sempre em destaque.
Na discussão desse tema é conveniente lembrar que o País viveu no passado recente momentos muito difíceis no mercado de trabalho. Além do desemprego propriamente dito, havia uma rápida expansão do trabalho informal. Na década de 1990, apenas um em cada 10 empregos gerados era com carteira assinada. Ou seja, 90% dos postos de trabalho estavam sendo preenchidos por meio de contratos de pessoas jurídicas, as famosas PJ.
Diante dos custos elevadíssimos da contratação de mão de obra formal, em muitos casos superando 100% do valor do salário, e diante também dos efeitos da estagnação e do baixo crescimento, empresas de todos os tamanhos, muitas em desespero de causa, lançavam mão desses contratos não convencionais, em desacordo com a lei trabalhista.
Esse cenário de relações de trabalho, com crescimento agressivo da informalidade, era uma dor de cabeça para empregado e empregador. Naquele momento, havia a certeza de que a solução do problema exigia duas mudanças: uma na legislação trabalhista, para simplificá-la e reduzir os custos da contratação de mão de obra formal, e outra no ritmo de crescimento econômico.
Ambas ocorreram de forma parcial nos últimos 10 anos. A primeira veio apenas recentemente, com as desonerações de folha de pagamento, medidas que beneficiaram alguns setores e, importante lembrar, são ainda muito humildes e provisórias. Permanece até hoje, portanto, a elevada imposição de impostos e encargos sobre os salários, um dos principais fatores responsáveis pelo Custo-Brasil.
A segunda mudança também foi parcial. Mesmo longe do ritmo chinês, o PIB brasileiro avançou nos últimos 10 anos o suficiente para mudar bastante aquela situação de balbúrdia nas relações trabalhistas.
Com a elevação do ritmo de crescimento, foram criadas 15,4 milhões de vagas formais de 2003 até agora. Nos cinco anos da crise global, a criação de postos atingiu 7,7 milhões.
Mesmo assim, em razão do crescimento da força de trabalho nesse período, ainda havia cerca de 44 milhões de trabalhadores informais em 2011, segundo os dados mais recentes disponíveis. O índice de formalização, porém, evoluiu de 45% das pessoas ocupadas com mais de 16 anos em 2001 para 56% em 2011.
O País certamente precisa de muitas reformas e mudanças de rota. Mas propor aumento do desemprego é um contrassenso. A “bronca” de O’Neill, sim, faz sentido. Alguém pode imaginar o que seria do País se esses 7,7 milhões de empregos formais não tivessem sido criados nos últimos cinco anos?
Diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro-vice-presidente da Fiesp
Jornal do Comércio - RS
Benjamin Steinbruch **
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