Até o momento, tivemos poucas pistas do que será o governo da presidente Dilma Rousseff. O que se sabe, em linhas gerais, é a interpretação do que diz o slogan do novo governo: "País rico é um país sem pobreza". Numa primeira análise, provavelmente, os primeiros anúncios virão carregados de programas voltados ao combate à miséria e à promoção social, o que é louvável. Para esta empreitada, a presidente sabe que poderá, mais uma vez, contar com os industriais, sempre dispostos a contribuir com o desenvolvimento econômico e social do País.
No entanto, algumas questões, que de há muito estão postas, precisam ser tratadas com atenção redobrada e com a devida urgência.
Nas primeiras reuniões que mantivemos com ministros e secretários das pastas com as quais a Abinee se relaciona mais diretamente, denotamos que todos eles têm clara consciência sobre a extensão dos problemas que as indústrias do setor eletroeletrônico vêm enfrentando nos últimos anos.
O maior deles, a alarmante perda de competitividade causada por uma moeda extremamente valorizada e que está levando o país a um processo de desindustrialização e transferência de emprego para outras nações. Como já citamos, o governo tem conhecimento desse problema, porém ainda não conseguiu, salvo algumas manifestações extraoficiais, estabelecer um grau de prioridade para agir em favor da indústria.
Essa questão nos remete à política de comércio exterior. O cenário externo ainda é de incertezas e, em função disso, os países estão se mobilizando para defender os seus mercados e a geração de empregos, estabelecendo políticas públicas de incentivo à produção industrial.
Nesse sentido, acompanhamos, recentemente, a movimentação da Argentina, que, ampliou de 400 para 600 a lista de produtos que necessitam de licença prévia para importação, incluindo bens eletroeletrônicos. Apesar de a medida contrariar as regras do Mercosul, e poder afetar cerca de 50% das nossas exportações, a decisão, a nosso ver, não deve ser retaliada, pois nossos vizinhos estão fazendo a sua política industrial, o que deveria servir de exemplo para o Brasil.
Com previsão de anúncio para o mês de abril, a nova PDP, que está em gestação e que conta com a valiosa contribuição da CNI e, por consequência, de entidades como a Abinee, deve priorizar medidas de curto, médio e longo prazo, como forma de amenizar a perda de competitividade da indústria.
Algumas dessas medidas, temos apresentado para representantes do governo, como, por exemplo, a elevação da alíquota do Imposto de Importação de uma cesta de produtos para 35%, limite permitido pela Organização Mundial do Comércio (OMC).
Outra proposta diz respeito à desoneração da contribuição patronal ao INSS da parcela exportada da produção dos bens do setor elétrico, nos moldes já adotados para o setor de software.
Além dessas medidas, é importante destacar que, para a construção de uma política industrial efetiva, devemos utilizar todas as armas disponíveis, incluindo as medidas de defesa comercial. Afinal, estamos numa "guerra", e acreditamos que este é o momento do Brasil parar de ser tão tolerante nas relações comerciais com seus parceiros.
Compreendemos que o Brasil, no caso da China, por exemplo, mantém uma balança superavitária, fortemente baseada nas vendas de commodities, como a soja, o minério de ferro e outras. Entretanto, no setor eletroeletrônico, o déficit na balança do Brasil com a China foi de quase US$ 12 bilhões, em 2010, um crescimento de 58% em relação a 2009.
Para um caso como esse, o governo brasileiro deveria adotar medidas semelhantes às da Argentina, como forma de reduzir a entrada de produtos que invadem de forma predatória o nosso mercado. Falamos, principalmente, dos bens acabados vindos da China, que, escorados numa moeda desvalorizada artificialmente e numa mão de obra quase que escrava, promovem uma concorrência desleal com os nossos produtos.
Algumas ações para reverter esse quadro desastroso começam a surgir como a decisão do Inmetro em incluir cerca de 120 novos produtos na lista dos que precisam ter selo de qualidade para a entrada no País, entre eles eletroeletrônicos e utensílios elétricos residenciais.
Outra sinalização positiva, prometida para abril, vinda do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, é a aplicação de regras de controle na entrada de produtos no País, com a exigência de certificação de segurança, sanitária e outros. São medidas que vemos com bons olhos e que poderão trazer efeitos favoráveis para o nosso setor.
No âmbito interno, porém, se quiser retomar o processo de industrialização, o governo necessita, urgentemente, abrir seu leque de ações, retomando os investimentos em projetos de infraestrutura para suprir as carências do País e, também, para garantir o sucesso da realização dos importantes eventos esportivos que sediaremos nos próximos anos.
Se bem aproveitados, esses investimentos poderão servir para estimular o desenvolvimento das empresas instaladas no País, permitindo a geração de empregos [também no País] e implantando, por consequência, um ciclo virtuoso na economia brasileira.
Nossa expectativa é que passemos, o quanto antes, do plano das intenções para as ações, e que o setor industrial seja encarado como prioridade no Brasil, pois, um país rico, sem pobreza, não pode abrir mão da força de sua indústria.
Autor(a): HUMBERTO BARBATO
Presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee
29/03/2011
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