O governo Dilma transformou a política fiscal em um jogo de "faz de conta". Manteve a meta de superávit primário para este ano e para 2014 em 3,1% do PIB, mas criou tantas exceções que, mesmo conseguindo um resultado muito inferior, de menos da metade da meta, poderá dizer que a alcançou.
Há tempos a política fiscal vem sendo afrouxada, com a permissão do abatimento de investimentos em projetos do Programa de Aceleração do Crescimento e das desonerações fiscais do cálculo do superávit primário.
A mais recente inovação contábil, destinada a tornar cada vez menos rigoroso o controle dos gastos públicos, é a suspensão da obrigatoriedade de o governo central produzir superávits adicionais para que a meta seja cumprida mesmo quando Estados e municípios apresentarem desempenho fiscal insatisfatório.
Na prática, isso exclui Estados e municípios do cálculo do superávit primário e abre espaço para o governo continuar gastando.
Como fez quando adotou outras medidas para afrouxar a política fiscal, também desta vez o governo alegou a necessidade de executar "políticas anticíclicas", isto é, destinadas a estimular a atividade econômica quando ela se mostrar fraca.
Na prática, o enfraquecimento ainda mais acentuado da política fiscal será feito por meio da mudança da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que fixou as regras para a execução orçamentária durante 2013, excluindo a obrigatoriedade de o governo central compensar os maus resultados fiscais de Estados e municípios, e da inserção dessas regras no projeto da LDO para 2014, já enviado ao Congresso.
Para não caracterizar de maneira explícita o abandono do rigor fiscal, o governo manteve a meta de superávit primário para este ano e o próximo.
Em valores, a meta de 3,1% do PIB corresponde a R$ 155 bilhões em 2013. Desse total, o governo central deveria responder por R$ 108,1 bilhões, ou 2,15% do PIB.
Mas já foi autorizado a abater desse valor os investimentos do PAC e as desonerações fiscais, no valor de R$ 65,2 bilhões. Ou seja, na prática, sua meta foi reduzida para R$ 42,9 bilhões, ou 0,9% do PIB.
Como não precisará mais compensar a fatia que poderia faltar nos resultados dos Estados e municípios para atingir o total (a parte dos Estados e municípios foi prevista na LDO em R$ 47,8 bilhões, ou 0,95% do PIB), se o superávit fiscal do governo central ficar em 0,9%, tudo estará certo. Isso equivale a uma redução de 70% da meta oficial de superávit primário.
O resultado poderá ser um pouco melhor, pois o governo calcula que o superávit primário dos Estados e municípios em 2013 poderá alcançar 0,6% do PIB. Somado ao resultado do governo central, o superávit equivalerá a 1,5% do PIB, menos da metade da meta.
A mesma regra valerá para 2014. Como o projeto da LDO para 2014 se baseia em parâmetros otimistas - crescimento de 4,5% do PIB, inflação de 4,5%, taxa básica de juros de 7,25% e salário mínimo de R$ 719,48 -, o superávit primário será maior, mas os efeitos nocivos da mudança na execução da política serão muito parecidos com os que se registrarão em 2013.
A insistência do governo em manter formalmente uma meta que indica rigorosa gestão das finanças públicas é mais um elemento da farsa em que se transformou a política fiscal do PT.
Como as inconsistências estão corroendo a credibilidade de sua política econômica, este era o momento de o governo Dilma reagir às desconfianças crescentes por meio do controle mais estrito de suas despesas, sobretudo as de custeio, para dispor de mais recursos para investir e estimular a atividade econômica.
Mas faz exatamente o contrário, ao reduzir na prática as metas de superávit primário e, assim, abrir espaço para gastar mais - e mal, como mostram os resultados até agora pífios de suas "políticas anticíclicas".
Mudanças como as que acabam de ser anunciadas "só aumentam a incerteza em relação à política econômica", disse o pesquisador do Ipea Mansueto Almeida.
É nesse clima que o Comitê de Política Monetária decide o juro básico que vigorará até o fim de maio.
Fonte: O Estado de São Paulo - SP
Nenhum comentário:
Postar um comentário