quinta-feira, 30 de julho de 2015

Argentina teme impacto da desvalorização do real


Em plena campanha eleitoral pela sucessão da presidente Cristina Kirchner e com a economia argentina mergulhada numa recessão, a Casa Rosada admitiu ontem “monitorar permanentemente” a evolução do real. A preocupação entre empresários argentinos é cada vez maior e tornou-se evidente durante encontro organizado pela UIA na província de Córdoba, no qual representantes da indústria local admitiram que a desvalorização da moeda brasileira gera “incertezas” no país. Na opinião de economistas argentinos, a desvalorização do real terá impacto nas exportações do país para o Brasil e provocará mais escassez de dólares. A Argentina enfrenta dificuldades no mercado cambial desde 2011, o que levou o governo de Cristina a aplicar restrições para a compra de moeda americana. O cenário, segundo economistas locais, deve piorar, já que a crise brasileira provocaria redução das exportações para o Brasil e, portanto, dos dólares que entram no mercado argentino. Juntos, Brasil e China, dois países que atualmente despertam preocupação nos mercados, representam quase 30% do comércio exterior argentino. "O Ministério da Economia monitora permanentemente essa situação", declarou o chefe de gabinete, Aníbal Fernández. Ele negou que o governo Kirchner esteja analisando a implementação de medidas específicas para proteger a economia nacional, principalmente o mercado cambial. Nos últimos dias, o dólar paralelo voltou a subir, superando a barreira dos 15 pesos, acima da cotação oficial, de 9,19 pesos. Segundo o jornal “Clarín”, o ministro da Economia, Axel Kicillof, está avaliando a possibilidade de usar mais reservas do Banco Central para conter a demanda de moeda americana e evitar a disparada do dólar. Na opinião do ex-secretário da Industria Dante Sica, diretor da consultoria Abeceb, a desvalorização do real terá impacto a curto e médio prazos: "Estamos numa recessão. A situação do real agravará nossa crise. Venderemos menos ao Brasil, e entrarão menos dólares, aumentando a tensão cambial". O economista lembrou que as exportações de carros representam, junto com o trigo, 70% das vendas ao mercado brasileiro. A projeção de exportações do setor automobilístico argentino para o Brasil este ano caiu de 600 mil carros para em torno de 550 mil. "A médio prazo, a desvalorização do real aprofundará a diferença de competitividade entre os dois países, a favor do Brasil", apontou Sica. A OMC determinou que em 31 de dezembro a Argentina elimine barreiras às importações. Para Sica, se o governo não adotar medidas de correção que melhorem a competitividade, as tensões serão fortes. Em junho, segundo a Abeceb, as exportações argentinas para o Brasil recuaram 15%. No primeiro semestre, o país acumulou déficit de US$ 923 milhões com seu principal sócio no Mercosul. "Exportar para o Brasil está ficando mais difícil", admitiu o economista Nicolás Dujovne. No encontro em Córdoba, o presidente da Fiat argentina, Cristiano Rattazzi, disse que a desvalorização do real, o atraso cambial argentino e a inflação formam um “coquetel perigoso para a indústria”: "Em termos de competitividade com o Brasil, estamos no pior nível dos últimos 13 anos". O economista lembrou que a origem da gravíssima crise econômica sofrida pelo país em 2001 foi a desvalorização da moeda brasileira, dois anos antes. Para ele, muitos argentinos têm um sentimento de déjà vu: "A desvalorização do real reafirmou a visão de que um câmbio a 9,19 pesos é insustentável". Para ele, uma eventual desvalorização do peso só acontecerá após as eleições presidenciais de 25 de outubro: "O governo Kirchner não vai facilitar as coisas para o próximo presidente".
O Globo
30/7/2015

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