Os anos dourados da América Latina ficaram para trás. Após quatro anos de redução nos preços das commodities, ninguém mais duvida que o período de vacas gordas passou para as nações que se especializaram em produzir petróleo, minérios e alimentos. Segundo a Cepal (comissão econômica ligada à ONU), a região deverá ter em 2015 a menor expansão dos últimos 16 anos -com exceção de 2009, quando a crise americana afetou o mundo inteiro. As recentes turbulências no mercado financeiro chinês, hoje principal parceiro comercial da maioria dos países latinos, alimentam a previsão de anos difíceis pela frente. "Não voltaremos a ver por muito tempo o crescimento alto que vimos na região nos anos 2000. Com sorte, voltaremos a crescer a taxas perto de 3% ao ano", diz o economista argentino Guillermo Calvo, professor da universidade americana de Columbia. A China está em processo de desaceleração e consumindo menos matérias-primas. Segundo a Cepal, 80% das vendas da América Latina para o gigante são commodities. Além disso, os investidores estão cada vez mais convencidos da recuperação dos EUA, deixando de lado a aposta em ativos ligados a matérias-primas, o que contribui para a liquidação nos preços das commodities. De janeiro de 2011 a maio deste ano, segundo a Cepal, os preços das matérias-primas energéticas caíram 29%, as minerais, 39% e as alimentares, 30%. O preço do barril do petróleo, que há um ano custava US$ 106, valia menos de US$ 40 na última semana. Isso propagou as dificuldades que já se viam em Brasil, Argentina e Venezuela a países produtores de petróleo, como Colômbia e México. "Viramos a fase do super ciclo [de alta], e desapareceu o fator automático de elevação do PIB por meio das commodities. Mas não se está no desastre de preços dos anos 80 e 90", afirma Otaviano Canuto, diretor do FMI. Amparados no consumo doméstico, Paraguai e Bolívia, as novíssimas economias emergentes da região, terão crescimento ao redor de 4% neste ano. Mas não são imunes ao contágio da moderação sobre os países vizinhos. Colômbia, Peru e Chile aproveitaram os anos dourados para fazer reformas e poupar e, por isso, também têm mais fôlego agora. Já Brasil, Argentina, Venezuela e Uruguai "esbanjaram" na fase da bonança e entram nessa etapa com maior vulnerabilidade. "Os países gastaram muito, e não apenas os governos, as famílias também. Todos terão que gastar menos", diz Calvo, referindo-se a ajustes, como o que está em curso no Brasil. Canuto lamenta que o país não tenha aproveitado a boa fase para reduzir a dívida pública ou fazer reformas que ajudassem setores a sustentar a economia na baixa. Como resultado, há o risco de perda do grau de investimento e desindustrialização. Para Daniel Titelman, chefe da divisão de desenvolvimento econômico da Cepal, as dificuldades continuarão pelos próximos dois anos pelo menos. E o que mais preocupa o analista é a contração dos investimentos na região. "Os países têm que reativar os investimentos em setores não relacionados às commodities, como a infraestrutura, por exemplo". Segundo Calvo, a má notícia é que as previsões de menor crescimento freiam também as expectativas de ganhos sociais, medidos pela renda per capita da população. "Como reagirá a população que ascendeu à classe média e poderá voltar à pobreza? Isso não é um problema de Dilma Rousseff ou de Aécio Neves, é de todos. A direita e a esquerda se enfrentarão com os mesmos problemas, lamentavelmente".
Folha de S. Paulo
31/8/2015 |
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