Dólar em alta e renda em baixa compõem a receita considerada ideal, por governo e especialistas, para a melhora das contas externas brasileiras na atual conjuntura. É nesse cenário de economia fraca — com importações caindo mais do que as exportações, e os gastos com viagens ao exterior encolhendo — que, no primeiro semestre de 2015, as contas externas apresentaram números mais tranquilizadores do que no ano passado. Destaca-se a virada no saldo da balança comercial que, nos seis primeiros meses deste ano, registrou um superávit de US$ 2,2 bilhões, contra um déficit de US$ 2,5 bilhões no mesmo período de 2014. Ou seja, a diferença chega a US$ 4,7 bilhões. O resultado positivo, porém, tem mais a ver com a diminuição das compras internas do que com o aumento das exportações. Uma das exceções a essa regra é o setor de manufaturados, que vem conseguindo ampliar suas vendas. Cálculos da AEB, feitos a pedido do GLOBO, mostram que o impacto positivo do câmbio se dará diretamente nos produtos industrializados, em contraponto ao fraco desempenho das receitas obtidas com os embarques de commodities, responsáveis pela maior parte das exportações. Segundo a AEB, a balança de manufaturados sairá de um déficit recorde de US$ 109 bilhões em 2014 para um saldo negativo menor, em torno de US$ 82 bilhões, graças ao aumento das exportações de produtos como aviões, automóveis, autopeças e açúcar refinado. "A participação dos produtos manufaturados na pauta de exportação será elevada de 35,6% em 2014 para 38,1% em 2015. Com a desvalorização do real frente ao dólar, as exportações dessa categoria de produtos serão parcialmente beneficiadas, em especial aquelas destinadas aos Estados Unidos", prevê o presidente da AEB, José Augusto de Castro. Ele lembra que os países da América do Sul, tradicionais e principais importadores de manufaturados do Brasil, estão reduzindo suas importações, devido à queda das cotações de suas commodities exportadas. O problema em relação à balança é que o superávit deste ano é fruto de uma queda acentuada das importações e não do crescimento das exportações em geral. De acordo com Castro, o crescimento de 2,5% previsto pela OMC para o comércio mundial em 2015 e a queda de 15% estimada para as exportações brasileiras reduzirão para algo entre 0,98% e 1,02% nossa participação nas exportações mundiais. No ano passado, a parcela brasileira no total comercializado no mundo era de 1,18%, mas o índice já chegou a 1,42% em 2011. "As condições de contínua piora em renda, crédito e confiança vêm elevando o risco de recessão da economia. O único canal que pode permitir alguma suavização do ciclo econômico é o setor externo, com queda das importações e aumento das exportações. O setor externo suaviza a desaceleração", diz o economista-chefe do Banco Votorantim, Roberto Padovani. Ele destaca que, quando o déficit em conta corrente cai, melhora a situação de risco e, com isso, a percepção em relação ao Brasil. Em sua opinião, o único motor do crescimento ao longo dos próximos trimestres é o setor externo. "Neste ano e no próximo, a desvalorização da moeda e o crescimento global, especialmente dos EUA, ajudam as exportações. Além disso, a redução dos custos locais de produção eleva a competitividade externa, devendo colaborar com o setor no ano que vem", prevê. Ele acrescenta que, do lado das importações, a queda no consumo doméstico e a alta do dólar reduziram fortemente os gastos no exterior. Assim, a melhora da balança em 2015 e 2016 está associada a uma queda das importações mais profunda e a uma leve melhora das exportações. "Nossas estimativas indicam que a balança comercial deverá mostrar importante recuperação, saindo de um déficit de US$ 3,9 bilhões em 2014 para um superávit de US$ 6 bilhões neste ano e US$ 13 bilhões em 2016", completa o economista. O presidente da AEB espera um superávit comercial em torno de US$ 8 bilhões em 2015. Já os economistas da GO Associados projetam um saldo positivo de US$ 10,5 bilhões na balança comercial em 2015 e de US$ 13 bilhões em 2016. A GO também espera um déficit em transações correntes de US$ 81,1 bilhões este ano e de US$ 75 bilhões em 2016. No primeiro semestre deste ano, as contas externas apresentaram um saldo negativo de US$ 36,7 bilhões, montante 20% inferior ao rombo registrado no mesmo período de 2014. A expectativa de fontes da área econômica é que em outubro o efeito da desvalorização do real frente ao dólar verificado desde 2014 passará a ser sentido integralmente.
O Globo
27/7/2015
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